terça-feira, janeiro 19, 2010

Exercicio


Um zumbido incessante entupia-lhe os ouvidos e apenas o que ouvia era aquela voz. Rouca e seca.
Ainda não se tinha dado conta que realmente estava vivo. Vivo e bem, excepto a surdez, que era apenas passageira. Quando o choque sonoro é forte pode perder-se a audição, ou pelo menos é essa a sensação.
Haniak aos poucos veio a si, coitadinho, tentando sentir cada parte do seu corpo. Primeiro, os seus pés e mãos em simultâneo, depois a barriga, o pescoço e por fim a cabeça.
Estava bem.
Levantava-se lentamente quando começou a ouvir ao longe os gritos, uns de aflição, outros de ordem, outros de revolta e, concluindo que tudo voltara à normalidade, por fim, abriu os olhos. Era o que sempre lhe custava mais. Abrir os olhos. Tinha medo de os abrir, de ver o que já imaginava pelos gritos do exterior. A devastação.
Começava a habituar-se, apesar dos seus 10 anos.
Mas como pode uma pessoa habituar-se a tanto sofrimento?
É..! É possível e ele, desde os 3 anos, órfão de pais, idade em que começou a ter percepção do que o rodeava, era a prova disso.
A Guerra tinha lhe levado tudo e todos.
Estava só! Especialmente só, desde a partida do avô há uns dois anos atrás, quando um “homem-bomba” se tinha enfiado no mesmo autocarro que o velho.

Titulo:. A voz.

Lista:. (A lista é um conjunto de ideias que ao analisar certa imagem, paisagem, pessoa, acção, etc., me vem à cabeça antes de começar a escrever.); forte, cenário de guerra, depois vendo bem pareceu-me um miúdo pobre com medo do pai; porta; miúdo; tábuas; pedras; barraca; Cabo-Verde; casa sem telhado; preto; branco; medo; pai mau; guerra; choro; Deus.

Por:. Tomás Pimenta da Gama